20.7.07

737-100


Boeing 737-100, o primeiro da série, apelidado carinhosamente de "Baby Boeing" pelos que o consideravam uma miniatura do portentoso B 707.
Tenho carinho por esse modelo. Era ele, pintado nas cores da Varig, que me trazia para o carinho de tios, primos e avó, aqui no Rio, quando eu morava láááá em Maceió. Vinha sentada na 1A, com aquela bolsinha plástica de menor desacompanhado no pescoço, trazendo minha certidão de nascimento e a autorização do Juizado de Menores do Aeroporto Campo dos Palmares - MCZ, constando o nome dos responsáveis a quem eu poderia se entregue no portão de desembarque. Lembro que o vôo saía na hora do almoço, e sempre tinha aquele medalhão com batata noisette no serviço de bordo. Recebia a revista do Variguinho, conversava com os comissários, fazia amizade com algum adulto que vinha do meu lado. De vez em quando tomava um pequeno banho de Coca-Cola, consequência das turbulências típicas do horário, da estação do ano e da região... certa vez, numa descida muito rápida no Galeão, lembro da comissária, elegantíssima no seu uniforme azul-marinho denunciando uma discreta barriguinha de gravidez, que do seu assento fazia movimentos de mascar chiclete para aliviar a pressão nos ouvidos, de forma que eu e outra menina do meu lado repetíssemos. Tudo muito divertido.
Mas não é só disso que eu me lembro.
Havia, também, as cores das poltronas - amarelo, laranja e verde - e seus relevos que remetiam a plantas (isso eu achava meio feinho - preferia a Vasp e a Transbrasil!), as instruções de segurança várias vezes vistas, além de outras reminiscências: a primeira vez num wide-body, logo um Jumbo da Pan-Am, enorme, majestoso, e que parecia ainda maior perante os olhos de uma menina de 10 anos; os queijinhos tipo Polenguinho, que então eram raros nos supermercados brasileiros, mas estavam sempre no catering dos aviões; o cheiro típico de combustível; as curvas suaves descritas no ar; o calor extremo que fazia - e faz - nos túneis que ligam o avião ao interior do Galeão; os pequenos aeroportos do Nordeste; as voltas infindáveis sobre Maceió, toda vez que não tinha "teto" pra pousar; o piti de dois comissários da Transbrasil, me tirando da saída de emergência, num vôo mais... emocionante. Curioso como tudo era bom, tudo terminava bem. Voar era sinônimo de alegria, uma pontinha de orgulho de cruzar os céus do Brasil sempre.
Infelizmente, voar pra mim há muito deixou de ser uma felicidade tão grande. Ainda sou encantada por aviões, mas meu conforto começou a esmaecer com a primeira grande tragédia que acompanhei: o Fokker 100 da TAM se espatifando nas redondezas de Congonhas, em 1996. Dois anos depois, um vôo traumático me levou a ter medo, e também muita raiva. Raiva! Como alguém que já viajara tanto, que sabia o quanto os aviões eram seguros, poderia ter medo de voar? Não me conformava com isso! Teimosa que sou, continuei voando, voando e voando... até arrefecer os sintomas do pânico.
Hoje, ao medo somou-se a tristeza de sua justificação. Em menos de 1 ano, dois acidentes brutais, de alto calado, ceifaram a vida de mais de 300 brasileiros. Não sou especialista, mas não precisa ser mais que esperto pra saber que há algo de muito errado acontecendo. Na sexta-feira de Carnaval, passei quase 2 horas num finger do Galeão, esperando autorização para decolar num A-330 da TAP... só percebi o quanto havia atrasado já no ar - o papo com os meus pais me distraiu. Logo, só posso concluir que a ingerência e a irresponsabilidade com vidas tem que parar, e não por mim, que vôo - e continuarei voando - vez por outra, mas para os milhares que utilizam aviões com frequência. Tenho pessoas queridas nesse grupo, assim como outras, aeronautas, que passam grande parte do seu tempo em aviões. Chega.
Desculpem o longo desabafo, mas não agüento mais ver tudo isso acontecendo à revelia.