5.6.10

Areal, 26 de maio de 2010

Lá fora, uma noite das mais belas. As poucas luzes do interior fazem com que o céu pareça mais negro, e a lua, mais clara. Ganas de desligar os faróis e vir assim, estrada afora, guiada pela luz da lua.
Sinto-me estranhamente feliz. Tantos desencontros nos últimos meses deveriam ter me cansado mais, mas apesar da provisoriedade da vida de hotel de segunda a sexta e da casa dos pais nos finais de semana, não consigo me chatear verdadeiramente. Poderia atribuir isso a toda tranquilidade que agora me cerca no trabalho e na vida, mas não é isso - ou, pelo menos, não apenas. É como se algo mais profundo e denso houvesse se mudado de dentro de mim. Não, não me tornei indiferente ao futuro, imagine! Ainda quero muitas coisas, e coisas diferentes. Só que agora tenho calma.
Viverei uma vida e ainda me surpreenderei com a minha capacidade de assimilação de mudanças, por mais radicais que elas sejam. O caminho por onde vim andando, por vezes ansiosa, desde criança, me fez assim. Agora, esqueço de carregar o celular, de responder emails, de ver notícias no jornal. A vida social está zerada e passo horas e horas comigo. Sei que tudo isso não dura pra sempre, e é por isso que não sou capaz de me perturbar. Melhor degustar a calmaria e preparar o espírito pra quando for necessário retomar a carga. A inquietação é parte de mim, ainda que por vezes adormecida.
Areal continua diminuta como sempre. Voltando do trabalho, paro o carro em frente à padaria da rua principal, hoje urbanizada, outrora de terra batida. Ali, quando eu era bem pequena, tive a visão de um touro furioso correndo atrás de mim e das primas da roça, num dia de casamento. Jamais passaria por minha cabeça que, um dia, aquela cidadezinha me acolheria tão gostosamente.
Sei que, nos próximos meses, terei decisões importantes a tomar. É preciso voltar a pensar na “grande” vida, e correr atrás, e fazer planos, nem que seja pra eles se desfazerem no ar enquanto outra coisa diferente nasce, menos ou mais pretensiosa, em seu lugar. Por enquanto, deixo que as coisas sigam seu rumo manso, mansinho. Pausa e fôlego.

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